Filme: CAFARNAUM (Capharnaum )

A história não pede licença para incomodar. O pequeno Zain vive no inferno real, e não naquele hipotético fantasioso. O subúrbio libanês é palco de suas andanças e corridas, e menino que nem a própria idade sabe (supõe-se 12) tem um número igualmente incalculável de irmãos e pais prontos a ganhar todos os prêmios de piores progenitores do cinema, mas ainda assim completamente palpáveis, sem exagero ou polidez. A força das circunstâncias transformou todos aqueles personagens no que eles são, párias na mais completa tradução; ainda que não caiba a condenação, muito menos a proteção a nenhuma atitude. Apenas o absoluto horror, e a tentativa de sobrevivência a ele. Pois Zain está preso. 12 anos e algemado. Mesmo. Sua trajetória será contada no filme, diante de um tribunal que está expondo todo aquela realidade desgraçada.

Tecnicamente o filme tem diversos acertos e um grande erro. O músico Khaled Mouzanar (também um dia roteiristas) compôs partituras muito bonitas que são tratadas pela direção com responsabilidade, evitando sempre a superexposição de um trabalho que nunca é melodramático. A fotografia de Christopher Aoun também contribui para a manutenção da atmosfera perpetuada no filme, que dá unidade aos diversos momentos que o filme salta, sempre com uma luz desconcertante e enquadramentos espetaculares. O grande problema (não apenas) técnico da produção é seu ritmo, infelizmente. De raiz ágil, com uma proposta de flashback bem conduzida e uma primeira hora incomparável, o filme cai a partir daí, praticamente trava em sua adrenalina emocional e começa a girar em círculos, onde a narrativa passa a repetir cacoetes e situações, sem motivo. Essa queda de ritmo prejudica a apreciação e até o envolvimento mais fiel com a obra. 

Felizmente como já comentado o melodrama consegue vencer a batalha e o filme se fortalece com essa pegada de emoção mais pontual. Econômico nos diálogos, os personagens são construídos por suas ações e em cima de atitudes, que os definem sem maniqueísmo. Pra fechar o pacote, um elenco impressionante é coroado com o miúdo Zain Al Rafeea, um prodígio em tudo que faz em cena, definitivamente um pequeno grande ator no qual o filme inteiro está depositado, e ele dá conta além do esperado. É também por causa dele que o trabalho de Nadine Labaki é uma evolução e uma revelação, do qual todos já ficam ansiosos pra conhecer o próximo passo.


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